Monday, May 14, 2007

O bom, o mau e o tremendamente feio!

Falemos então de resultados. O Inácio foi visitar a empresa “X”, veio de lá com um briefing e pede a comparência dos Area Managers de Inovação, Design e Engenharia para o ajudarem a construir a proposta. A nossa responsabilidade reside ao nível do conteúdo, definindo o caminho do projecto e o seu resultado expectável, no fundo, a estratégia do projecto. Depois de conversarmos um longo bocado, chegamos à conclusão de que o cliente não está a ver bem o problema; o que ele pensa resolver com uma leve alteração estética das tampas não vai, na realidade, provocar nenhum nível de diferenciação e, apesar de ter identificado limitações de investimento e problemas logísticos – uma grande quantidade de unidades no mercado com que o novo produto terá que conviver, conseguimos identificar níveis de diferenciação que podem ter um grande impacto no resultado do projecto e, se formos claros e objectivos no processo, conseguimos poupar nas ferramentas e no tempo de montagem e manutenção da solução. Fizemos isso em 2 horas, utilizando metodologia testada – cruzando actores, contextos de uso, necessidades, soluções e, servindo-nos da experiência de outros projectos. Dedicamos duas horas de valor acrescentado, esse valor foi comunicado e defendido pelo Inácio e vendeu-se um projecto por um valor superior ao esperado. Conseguimos desenvolver a solução, trabalhando com fornecedores identificados pelo cliente, chegando com a solução ao mercado a tempo de uma feira importante, com um produto muito bom e com um preço que permite ao nosso cliente ganhar algum “plus” até a concorrência dele o imitar.

Reunião de “kick-off” de uma proposta em que não participámos na execução. O Júlio tenta explicar que é um problema menor, que o cliente sabe muito bem o que quer, que se trata somente de fazer duas tampas para um produto simples. Ele afirma que o cliente se assume como um “me too”, não se quer diferenciar, quer simplesmente colocar um produto semelhante à sua concorrência a um preço mais baixo. Temos instruções para juntar duas das três peças existentes numa só, eliminando uma função que o cliente considera menor. O cliente recusou-se a ouvir qualquer outra aproximação ao projecto, argumentou com a falta de fundos para investimento, a falta de inovação no seu mercado, a necessidade de começar a produzir rapidamente. Avançamos a todo o vapor, não fazemos busca de soluções análogas, não confirmamos a teoria da eliminação da tal função, não pensamos em nada de novo, limitamo-nos a seguir escrupulosamente o que o cliente pediu. Cumprimos com a primeira fase do projecto rapidamente, entregamos um protótipo funcional que o cliente leva pela primeira vez a alguns dos seus clientes. Estes demonstram-se indiferentes perante o produto, confessam-lhe que já viram coisas parecidas, sugerem-lhe funções e detalhes assim à laia de “porque não”. O cliente vem ter connosco e pede para introduzir “umas melhorias” e nós somos forçados a apresentar um orçamento adicional, porque as tais melhorias quase obrigam a refazer o projecto. O cliente desespera, procura saídas, deixa de ter certezas. Decide fazer o que quer internamente. Consegue levar o produto à feira, em estado de protótipo pouco funcional. O “feedback” é baixo, quase nulo. Culpa tudo e todos.

O mesmo projecto, duas realidades e resultados distintos. Onde está a diferença? Na maneira de pensar, na maneira de fazer, no design de “o quê”. Tudo isto é design, e a maneira como fazemos este design influencia de uma forma dramática a rentabilidade dos projectos, o desenvolvimento das empresas, a sustentabilidade do sistema, a vida de um país. E agora digam, é ou não é uma realidade tremendamente feia!

Jornal de Leiria / Economia / 23 de Setembro de 2004

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