Monday, May 14, 2007

Não à taxa D!

Os designers são habitualmente chamados de sonhadores e utópicos, são constantemente recordados da necessidade de terem os pés bem na terra. Isto por quererem educar o gosto do publico melhorando o seu dia-a-dia com objectos bem pensados e desenhados, e ainda por cima, acessíveis. Que ilusão... Esta utopia não é uma moda, pois atravessa a curta história do design, desde os seus primórdios com Ruskin e Morris ao multi facetado Starck , neste momento a desenhar produtos “low cost” para as lojas TARGET http://www.target.com.

Durante anos os designers foram parte de algo que está a mudar drasticamente, algo que foi criado por eles mas que também e, em grande parte, foi uma imposição da mercantilismo. Chamo a isso a taxa D, ou a sobretaxa que nos habituamos existir com produtos chamados de design. Por um lado é verdade que a taxa é muitas vezes necessária, ou porque designers com um ego maior que a inteligência fizeram produtos para o seu umbigo que acabam por não ter compradores, ou porque designers mal formados aumentam os custos e a complexidade dos produtos em vez de os optimizar e simplificar. Mas a maioria das vezes somos nós como consumidores e, por consequência os produtores e intermediários, que valorizam o design aparente, a tal beleza inexplicável que nos leva a comprar coisas que não precisamos a um preço desmesurado, e que aceitamos e institucionalizamos a taxa D em tudo o que nos rodeia.

Neste momento, a mudança está a ser provocada pelos “lobos maus” da contemporaneidade – a China. Isto porque eles estão a investir no design como uma “commodity”, algo que serve para diferenciar o produto mas que não justifica por si só um aumento exponencial de preço. A China está a comprar o design, comprando literalmente os designers, quer ao nível da educação – faculdades inteiras de design a serem contratadas para uma temporada numa universidade Chinesa para ensinar os locais “a pescar”, quer ao nível da contratação de bons profissionais. Mas estes profissionais e o resultado da sua actividade não está a inflacionar os custos dos produtos que já não são somente produzidos na China, mas também pensados e desenhados na China e, atenção, em muitos casos com um design sofrível. Alguns dizem que a China não coloca esse premium porque não pode, porque não tem marcas que o suportem. Será isso, ou o país que pensamos estar a abraçar o ocidente com os dois braços mantém um braço no ar, em sinal de respeito pelas políticas socialistas assentes na democratização do gosto, o mesmo tipo de bagagem política que Morris carregava no seu tempo?

Desculpem se volto a mencionar a Apple, mas continuam a liderar em todas as frentes e agora, pasme-se, no preço! Lançaram um computador por menos de 500€ e um reprodutor de Mp3 por menos de 100€. Fizeram-no sem colocar em causa o design, sem baixarem a guarda no que diz respeito ä qualidade e aos detalhes. Fizeram-no racionalmente, aceitando que o preço e o design não são inimigos e que é possível, diria mais, essencial, adequar os produtos ao preço de forma a que eles sejam belos, atraentes, necessários, funcionais, correctos do ponto de vista social e, “on top of that”, baratos. Afinal a IKEA não vende somente porque os seus produtos tem um bom design, vende porque, para além disso, são baratos.

Este é quase um manifesto, que assumo todos os dias no âmbito do trabalho que desenvolvo. Digam NÃO à taxa D.

Jornal de Leiria / Economia / 17 de Fevereiro de 2005

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